Marcelo Jabulas | @mjabulas – Abordar temas como problemas psicológicos e saúde mental se fazem necessários para a compreensão e respeito às pessoas que sofrem com transtornos que fazem com que seu comportamento fujam ao que é aceito como padrão social. No entanto, entrar nessa seara, apesar de necessário, exige tato e sensibilidade. E é o que “Psychonauts 2” faz de forma lúdica, mas instrutiva e questionadora.
O segundo título da série do engenhoso estúdio Double Fine, fundado por Tim Shaefer (ex-LucasArts) chega para dar sequência à produção de 2015, que apesar de elogiada foi um desastre de vendas. O game coloca mais uma vez o jogador na pele de Raz, um jovem acrobata com habilidades telepáticas.
Raz simboliza justamente as distorções sociais em torno do diferente. O personagem é rejeitado pela família por conta de seus poderes. Trata-se de uma metáfora de muitas pessoas que sofrem preconceito por conta de deficiências ou até mesmo por habilidades extraordinárias como elevado nível de inteligência.
O protagonista entra para um acampamento especial e desenvolve novos poderes, mas descobre que um dos líderes do local, Dr. Loboto, pretendia usar os cérebros dos telepatas para equipar armas. Raz descobre que o vilão tinha conflitos de infância, envolvendo seu pai e que alimentava seu ódio.
São traumas, transtornos e doenças que atingem grande parte das pessoas, mas que ainda são vistas de forma preconceituosa e sem a devida atenção. Sheafer busca criar uma reflexão sobre saúde mental, usando os games.
Tudo isso é colocado de forma bastante discreta na trama. Não se trata de um game para ensinar a lidar com transtornos, mas dentro da história abre reflexões sobre como lidar com tudo que não é igual e nem considerado normal por nós mesmos.
O jogo
“Psychonauts 2” é um game de plataforma 3D que oferece recursos triviais de qualquer game do estilo. Saltar, esquivar, atacar e usar habilidades especiais. No entanto, tudo é salpicado de um enredo com elementos surreais, que exploram a temática do cérebro.
O jogador se envolve em missões que parecem existir apenas em sua imaginação e precisa utilizar seus poderes telepáticos para conseguir vencer os quebra-cabeças e saber lidar com os inimigos e chefes de fase.
O game é intuitivo e o jogador não demora para entender a lógica dos comandos e nem mesmo as alternâncias de câmera, que fazem o jogo bastante dinâmico.
Gráficos de Psychonauts 2
A direção de arte de “Psychonauts 2” é brilhante. Shaefer, que já trabalhou em grandes títulos da LucasArts como “Day of the Tentacle”, “The Secret of Monkey Island”, “Grim Fandango” e “Full Throttle” parece ter descarregado toda bagagem estética sobre o game.
Logo no início do jogo há uma cena em que aparecem dentaduras de corda gigantes, atacando um dos personagens. Quem jogou “Day of Tentacle” irá se lembrar de que a dentadura de brinquedo é um item fundamental no desenrolar do game.
O próprio Dr. Loboto remete ao lunático Dr. Fred Edson, de “Maniac Mansion”, antecessor de “Day of Tentacle”.
Com personagens cartunescos, cenários surreais, que alteram o padrão de jogabilidade, trata-se de um game em que o visual não é apenas um pano de fundo, mas um elemento que envolve o jogador.
Palavra final
“Psychonauts 2” é um game fantástico. Assim como produções recentes como “Lost in Random”, que busca na narrativa recursos para ir além de uma combinação de comandos, o game instiga o jogador a refletir sobre assuntos delicados, mas sem ser doutrinador ou criar rótulos.
Ele mostra de forma sutil como a não compreensão de diferenças ou problemas emocionais podem causar danos nos indivíduos. Tudo isso misturado de muitos pulos, poderes, personagens caricatos e missões divertidas.
Há muito tempo os games são utilizados para promoção, propaganda ideológica, como games de guerra que criam uma realidade paralela sobre culturas e diferentes povos. E ao invés de criarem um novo inimigo da humanidade, Tim Shaefer e seu time apenas nos mostram que há assuntos sérios que precisam de reflexão.
Disponível para PC, PS4, Xbox Series X/S e Xbox One, com preços entre R$ 250 e R$ 320.